A aquisição da consciência demanda tempo e esforço humano, tornando-se o grande desafio do processo da evolução do ser.
Surgem-lhe os pródromos, na fase do instinto, abrindo espaço para a razão, como fenômeno natural do desenvolvimento antropológico-psicológico-socio-lógico da criatura.
O discernimento do bem e do mal, do certo e do errado, e as aquisições ético-morais aparecem, como se fossem o medrar espontâneo da essência divina de que é constituído o Espírito; todavia, o aprimoramento e a profundidade desses valores dependem do empenho, do interesse, das realizações de cada um.
Herdeiro dos arquétipos remotos dos seus antepassados, o indivíduo mantém por atavismos religiosos e culturais a consciência de culpa, especialmente os ocidentais, vitimados pelas heranças judaico-cristãs, no que diz respeito à desobediência de Eva, no paraíso, e ao fratricídio cometido por Caim contra Abel.
A divina punição de Deus pela rebeldia da mulher e pela insensatez do homem, que a seguiu no erro, responde pelo sofrimento que os acicata, assim como a expulsão do criminoso aumenta-lhe a angústia, dando-lhe margem ao ciúme doentio e à raiva, considerando a preferência injustificável de Deus por Abel, cujas oferendas mais O agradavam...
A absurda aceitação literal do texto bíblico, que tem um caráter simbólico, quiçá para demonstrar o momento em que surge a consciência, — quando o ser pode identificar o que deve, daquilo que não lhe é lícito realizar, saindo do automatismo do instinto para a seleção do discernimento racional, representados no mito da Árvore do conhecimento do bem e do mal —devido a interpretações apaixonadas e fanáticas, gerou conflitos que ainda remanescem nas vidas psicologicamente imaturas.
Na fase do instinto, os fenômenos biológicos automáticos não se fazem acompanhar das dores, que são maiores conforme mais seja apurada a sensibilidade, qual sucede na ocorrência do parto, que passou a ser punição divina, tornando a procriação um verdadeiro castigo, fruto ainda da desobediência que, milenarmente, transformou a comunhão sexual em condenável e imunda, do ponto de vista puritano e hipócrita.
Fonte de vida, o sexo é o instrumento para a perpetuação da espécie, não sendo credor de qualquer condenação. O ultraje e a vulgaridade, a nobreza e a elevação amorosa mediante os quais se expressa, dependem do seu usuário e não da sua função em si mesma.
Igualmente a arbitrária eleição celeste de um por outro irmão, ambos gerados em circunstâncias iguais, teria que despertar ressentimentos contraditórios, de ciúme e de raiva, no rejeitado, que levariam inevitavelmente ao hediondo fratricídio...
De geração em geração, a criança que se sentia desprezada, desenvolveu esses sentimentos perversos, perturbando o desenvolvimento da consciência e a conseqüente conquista de si mesmo.
Em qualquer atividade, competitiva ou não, o inconsciente desatrela a insegurança infantil, ali adormecida, e surgem os conflitos, a infelicidade, a desconfiança desastrosa.
Graças, porém, à reencarnação, o progresso do ser é imperioso, inevitável, e os mecanismos da evolução se expressam, trabalhando-o e promovendo-o a níveis e patamares cada vez mais elevados, até quando o ser, liberto dos conflitos, conquista os sentimentos que canalizará na direção de novas metas, que alcança realizando-se, plenificando-se.
Já não luta contra as coisas, mas luta pelas coisas, que aprende a selecionar e qualificar, abandonando, por superação, as paixões dissolventes e fixando os valores que enobrecem.
Percebendo-se instrumento da vida, que faz parte da harmonia do Universo, o indivíduo supera a raiva, por ausência do ciúme, e não compete para destruir, mas trabalha para fomentar o progresso, no qual se engaja e se realiza.
A conquista de si mesmo resulta, portanto, do amadurecimento psicológico, pela racionalização dos acontecimentos, e graças às realizações da solidariedade, que facultam a superação das provas e dos sofrimentos, os quais passam então a ter um comportamento filosófico dignificante — instrumentos de valorização da vida — ao invés de serem castigos àculpa oculta, jacente no mundo íntimo.
A libertação dessa consciência doentia facilita o entendimento do mecanismo da responsabilidade no comportamento que estabelece o lema: A cada um conforme os seus atos, segundo ensinou o Terapeuta Galileu.
Senhor do discernimento, o homem descobre que colhe de acordo com o que semeia, e que tudo quanto lhe acontece, procede, não tendo caráter castrador ou punitivo. Sente-se emulado a gerar novos futuros efeitos, agindo com consciência e produzindo com eqüidade. Tal conduta proporciona-lhe a alegria que provém da tranquilidade da realização, considerando que sempre é tempo de reparar, e postergação é-lhe prejuízo para a economia da sua plenificação.
O homem que se conquista supera os mecanismos de fuga, de transferência de responsabilidade, de rejeição e outros, para enfrentar-se sem acusação. sem justificação, sem perdão.
Descobre a vida e que se encontra vivo, que hoje é o seu dia, utilizando-o com propriedade e sabedoria. Não tem passado, nem futuro, neste tempo intemporal da relatividade terrestre, e a sua é uma consciência atual, fértil e rica de aspirações, que busca a integração na Cósmica, que já desfruta, vivendo-a nas expressões do amor a tudo e a todos intensamente.
A conquista de si mesmo é lograda mediante o querer.
Jesus afirmou que se poderia fazer tudo quanto Ele fez, se se quisesse, bastando empenhar-se e entregar-se à realização. Para tanto, necessário seria a fé em si mesmo, nos valores intrínsecos, que seriam desenvolvidos a partir do momento da opção.
Francisco de Assis, o santo, assim quis e o conseguiu.
Apóstolos do bem, da ciência e da fé, do pensamento e da ação quiseram, e o lograram.
Homens e mulheres anônimos entregaram-se aos ideais que lhes vitalizaram as existências e, superando-se, autoconquistaram-se.
A conquista de si mesmo está ao alcance do querer para ser, do esforçar-se para triunfar, do viver para jamais morrer...
do livro O SER CONSCIENTE de Divaldo P. Franco pelo espírito Joanna d´Ângelis